segunda-feira, 1 de agosto de 2011

Sobre a normalidade

“Afinal o que é ser normal?”


O que questiono aqui tenho a consciência de que não é nenhuma novidade. No decorrer da história da humanidade muitas pessoas já estiveram a pensar a normalidade de sua época. Esse questionar as vezes surge espontâneo sem a influência de outros. Eu mesma no decorrer da minha curta existência por diversas vezes me encontrei e me encontro nesse estado de contemplação e indagação sobre a normalidade, sobre o que é ser normal. Nos primeiros momentos que tal dúvida surgiu em minha mente acreditei ser eu descobridora de uma dúvida até o momento impensada... mal sabia eu, que quase todos os seres humanos em algum momento de suas vidas também se encontram nesse estado de indagação. A diferença entre uns e outros, é que alguns, logo desistem desse estado magnífico de dúvida para caírem em um fatalismo naturalista de que o normal é o que está ai e dado, enquanto outros perseveram em tais dúvidas descobrindo o relativismo sobre as pretensas Verdades humanas, encontrando assim muitas outras formas de vida e de viver.

Também já é de se pensar que se tantos seres humanos em algum momento da vida se questionam sobre o normal é porque talvez ele não seja algo assim tão natural, tão determinado.


         Mas se não é algo natural, então o que é o normal?

Primeiro é importante darmos uma volta ao passado de nossa existência como ser humano e olhar criticamente tal passado. Lá vamos encontrar tão diferentes formas de pensar e viver que para nós hoje seria incabível. E porque naquela época não era incabível? Simplesmente porque era Normal. Vejamos um exemplo: A escravidão dos negros. Hoje mesmo, eu penso que várias coisas que fazemos aqui e agora e que são consideradas normais, talvez no futuro serão abominadas e estudadas como formas bizarras dos seres humanos de nossa época. Um exemplo (eu teria milhares de exemplos para dar): Hoje o ser humano força animais a se reproduzirem (muitos naturalmente não teriam mais condições de tal reprodução) simplesmente porque pertencem a uma raça, e vendem tais animais como mercadorias, e há aqueles que compram essas “mercadorias” dizendo que se preocupam com a vida deles, quando existem milhares de outros animais espalhados por nossas metrópoles sofrendo, precisando de atenção e carinho e que poderiam ser adotados (gratuitamente) mas não o são simplesmente porque não tem RAÇA. Aff.... seres humanos assim, são os normais que vemos diariamente andando pelas ruas com seus animais acorrentados reproduzidos em laboratório. Nesses seres humanos não existe sofrimento psíquico... sofrer porque? se nem pensam em suas ações e nas possíveis causas que elas podem gerar? Mas eles são os normais... 



Assim como o conceito de normalidade pode ser relativo digo o mesmo para sofrimento psíquico. Muitos pensam que o sofrimento psiquico é propriedade dos "doentes", enquanto os "normais" não sofrem. Eu vejo o sofrimento psíquico por vários ângulos.  
 
Pensar no ser humano sem sofrimento psíquico e plenamente adaptado ao meio é pensar em um negro na época da escravidão, sendo “tratado” por um psicólogo que o ajuda a aceitar os grilhões que foram-lhe impostos pelo meio social. Teríamos então, um negro feliz, adaptado ao ferro que machuca sua carne e que tira-lhe aquilo que um ser humano tem de mais precioso e que justamente o faz humano: a liberdade.

 

Se pensarmos que vivemos em uma sociedade injusta, preconceituosa, desumana, indiferente aos seus reais problemas, eu até acho mais do que natural que exista sofrimento psíquico. Anormal é não sofrer! Nesse estado social não é de se estranhar que existam tantos suicidas, tantos paranóides, bipolares, borderlines, compulsivos etc... etc.. Eles estão reagindo da forma natural que se deveria reagir a tais acontecimentos. Estranho mesmo é aceitar tanta injustiça com tanta passividade como todos os ditos “normais” aceitam, isso sim é de se estranhar... Por isso não vejo os esquemas desadaptativos como algo ruim, simplesmente é uma forma de negar o que não faz bem. É o conflito do humano com o desumano que não pretende ser. 



O órfão não sofre pela ausência de um pai e de uma mãe, ele sofre sim por viver em uma sociedade que valoriza a idéia de núcleo familiar sanguíneo, ignorando os que não possuem tais núcleos... Podemos ver em muitas sociedades indígenas que não existem órfãos, pois o filho de um é o filho de todos. Nesse sentido o órfão em nossa sociedade não deve tentar remediar sua falta criando uma nova família, isso seria somente fortalecer seu sofrimento. Deve ele sim, tomar consciência de seu sofrimento e fazer dele uma luta contra aquilo que fez ele sofrer: o núcleo familiar sanguíneo. Ou seja, num mundo que não é nada social, a melhor forma de se adaptar é se tornar antisocial.

Penso assim que o sofrimento não deve ser eliminado, o sofrimento é a reação saudável em resposta a um mundo insalubre. Devemos sim trazer esse sofrimento para consciência, mas não para extirpá-lo (sabemos que isso é impossível) e sim fazer com que esse sofrimento consciente seja uma arma que deverá ferir e matar aquilo que faz ele existente. Vejamos um exemplo: Os homossexuais por muito tempo estiveram nas listas de classificações de sofredores psíquicos. Mas o possível sofrimento deles era advindo de onde? Apenas de suas cabeças “loucas e pervertidas” (como por muitos foram classificados)? Ou será um sofrimento advindo do conflito de seus desejos com uma sociedade machista e retrógrada? Quando eles criaram coragem para lutar contra esses preconceitos, contra essa sociedade acabaram por sair da maldita classificação e fizeram seus desejos (antes pervertidos), em uma opção para a humanidade. Seres humanos assim são os Imortais. Desejo que possam todos àqueles que há longos anos estão fardados a carregar rótulos tão pesados criados não sei por quem, que se revoltem com tais criadores e destruam seus preceitos e preconceitos, e se não podem os destruir, que façam se calar.



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